Copa do mundo: por que torcemos?

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O dia de jogo de futebol da seleção brasileira no Campeonato Mundial de Futebol, conhecido no Brasil como Copa do Mundo, não é um feriado religioso ou cívico, contudo, há uma pausa dos trabalhos no sistema capitalista para acompanhar as partidas. Os trabalhadores assalariados são dispensados e os modos de produção são paralisados para que as pessoas possam assistir ao jogo e torcer pelo time de seu país. Essa tradição remonta as competições entre as nações representadas no esporte.

O nacionalismo como sentimento entre os habitantes de um dado limite territorial está ligado à formação dos Estados Nacionais, as chamadas nações, decorrentes do processo de centralização política na Europa Feudal na Baixa Idade Média (séc. XI-XV). A Europa era constituída por feudos, porções de terra pertencentes a um senhor feudal, uma nobreza, e habitada por servos. A intensificação das trocas comerciais, entretanto, exigiu que houvesse uma unificação de feudos com uma organização administrativa, moeda única, proteção das fronteiras, exército forte e homogeneização da cultura, para fazer frente ao acúmulo de riquezas de outros locais.

Um período de guerras sanguinárias se estabeleceu para definir quais famílias assumiriam o centro do poder destas unificações por meio das chamadas monarquias nacionais, depois, na Era Moderna (séc. XV-XIII), conhecidas como absolutistas ou Antigo Regime. A centralização do poder destas porções de terras era feita por meio de um poder absoluto, entenda-se sem liberdades democráticas. Elas só vão se tornar uma questão na Era Contemporânea (a partir de 1789) com o Iluminismo (séc. XII-XIII) e os Estados Nacionais, pensados a partir de repúblicas com governantes eleitos pelo povo.

O fato é que, a homogeneização da cultura por meio do nacionalismo com uma única língua, símbolos como bandeiras, hinos e costumes, contribuiu para tornar possível essa centralização, grandes porções de terra sob uma única administração das trocas comerciais, em um cenário de competição capitalista entre as nações. Um sentimento de pertencimento e luta por essa delimitação territorial a que pertence, que leva milhares de pessoas a guerrearem por ela.

O esporte, nesse sentido, atua como uma espécie de válvula de escape. Não lutamos na guerra para defender a nação, com atos violentos, mas canalizamos esse sentimento para uma disputa de jogo de futebol, para a competição por meio do esporte, em que regras de boa convivência devem ser cumpridos. As competições esportivas entre habitantes de um dado território, desse modo, surgem na Grécia Antiga através dos Jogos Olímpicos, com esse objetivo: canalizar competições de guerra por poder de forma saudável. Instintos competitivos de sobrevivência em nossa psique que podem ser performados através de competições esportivas de forma saudável.

A Copa do Mundo, em específico, foi idealizada em 1928, depois de algumas tentativas anteriores desde a fundação da FIFA (Federation International Football Association) em 1904, frustradas exatamente pela eclosão da competição armada entre as nações imperialistas, conhecida como Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Sua primeira edição foi realizada no Uruguai em 1930 e depois, interrompida pela eclosão da Segunda Guerra Mundial (1939-1945). O Brasil, por sua vez, se consolidou como país do futebol devido a popularidade deste jogo no país, principalmente nas periferias, pela sua característica de demandar de poucos equipamentos, facilmente improvisados com bolas e traves de materiais recicláveis, como panos, sacolas e etc; como também por envolver o fator criativo do drible no chamado futebol arte. Possui, assim, um significado de ascensão social para classes menos abastadas, e abre um horizonte de esperanças para uma nação subdesenvolvida.

Apesar da Copa do Mundo masculina ser a de maior repercussão, a copa do mundo feminina tem ganhado destaque, bem como a inserção de mulheres na narração dos jogos. Da mesma forma, pautas de inclusão tem avançado com os países na África e no Oriente Médio como países sedes, cargos de técnicos e do alto escalão vem sendo reivindicados por negros e há tentativas de reconhecimento da comunidade LGBTQIA+.

Parar as atividades de produção e comerciais na Copa do Mundo, muito além de gerar descanso e entretenimento para a população brasileira, está relacionado com o sentimento de nacionalismo, de competição entre as nações capitalistas canalizados por meio do esporte. Torcemos para esperançar dias melhores para o país, para alcançarmos soberania nacional de produção e industrialização sustentável, para nos tornarmos mais independentes das amarras exploratórias das nações desenvolvidas. Performamos nossa luta por sobrevivência no futebol arte brasileiro.