Denúncia de Felca sobre vídeos com crianças sexualizadas gera alerta nacional
A psicóloga Luana Dal Moro e o Conselho Tutelar de Laranjeiras explicam os impactos do caso; repercussão da denúncia evidencia urgência quanto às medidas
Na última semana, o influenciador digital Felca publicou um vídeo em seu canal do youtube que vem provocando um intensa repercussão e preocupação entre pais, educadores e autoridades. O conteúdo exposto por ele reunia exemplos de postagens em que crianças e adolescentes apareciam em situações consideradas inapropriadas: seminuos, realizando coreografias sensuais e acompanhados por músicas com letras de forte cunho sexual.
A denúncia, que rapidamente viralizou, expôs não apenas casos pontuais, mas um padrão preocupante no uso das redes sociais por menores de idade; muitas vezes com o consentimento ou incentivo de adultos responsáveis. A discussão que se seguiu trouxe à tona o tema da “adultização precoce”, processo pelo qual crianças e adolescentes são expostos a comportamentos, responsabilidades e estímulos próprios do mundo adulto antes de estarem emocional ou psicologicamente preparados para isso.
Preocupação unânime
Para compreender a gravidade do problema e as ações que podem ser tomadas, o Jornal Correio do Povo entrou em contato com o conselho tutelar de Laranjeiras do Sul e com a psicóloga Luana Dal Moro. Em suas ponderações, elas revelam uma preocupação unânime: a exposição indevida da imagem de crianças não apenas fere direitos previstos em lei, mas também provoca danos que podem perdurar por toda a vida.
A presidente do Conselho Tutelar, Irani de Oliveira, explica que o órgão é responsável por zelar pelo cumprimento dos direitos previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e atua diretamente quando há denúncias ou suspeitas de violação.
“O Conselho Tutelar identifica e atua em casos em que crianças e adolescentes são expostos a atividades incompatíveis com sua idade, como a utilização da imagem para fins lucrativos sem a devida proteção. Ao constatar crime, encaminhamos imediatamente ao Ministério Público, requisitamos serviços públicos nas áreas de saúde, educação e assistência social, e podemos até solicitar o afastamento do agressor quando necessário”, explica.
A conselheira Maria de Lurdes Pereira Matoso reforça que a prevenção começa dentro de casa.
“Muitas vezes, a exposição exagerada nas redes sociais ocorre porque os pais não percebem os riscos. É fundamental que haja supervisão, principalmente em conteúdos que contenham músicas de teor sexual ou coreografias sugestivas. A preservação da imagem é um direito assegurado pelo ECA e precisa ser respeitado para garantir um desenvolvimento saudável.”
Para Lindamir Aparecida Teston Kurylo, a questão jurídica é central para a proteção dos menores.
“A exploração econômica da imagem de crianças e adolescentes, quando feita sem os devidos cuidados, pode configurar crime, previsto no artigo 232 do ECA, além de violar o artigo 403 da CLT, que proíbe o trabalho de menores de 16 anos, salvo aprendiz a partir dos 14. É preciso lembrar que a internet não é um espaço sem lei”, ressalta a conselheira.
Andreia Amaral de Almeida destaca os impactos sociais e emocionais da adultização.
“A infância é um período de aprendizado e proteção. Quando exposta de forma indevida, a criança passa a viver sob pressão estética e midiática, que pode gerar ansiedade, baixa autoestima e até afastamento do convívio social. Em casos extremos, essa exposição pode ser porta de entrada para abusos.”
Já Simone Aparecida Nessa ressalta que existem investigações em andamento na comarca.
“Há casos sendo apurados, especialmente envolvendo exploração sexual de adolescentes. Nosso papel é garantir que medidas protetivas sejam aplicadas e que cada denúncia seja encaminhada às autoridades competentes. É uma atuação que exige agilidade, pois a exposição na internet pode se espalhar rapidamente”, afirma.
Efeitos psicológicos
A psicóloga Luana Dal Moro detalha os efeitos da adultização precoce sobre o desenvolvimento emocional.
“Quando a infância é deixada de lado, a criança assume responsabilidades e vivências para as quais não está preparada. Isso pode gerar ansiedade, depressão, baixa autoestima e dificuldade de socialização. Além disso, a exposição a estímulos de sexualização precoce, em uma fase em que ainda se está formando a identidade, pode provocar confusão de identidade e vulnerabilidade a abusos”.
Ela também reforça que a ausência de maturidade emocional torna os menores incapazes de lidar com problemas próprios da vida adulta.
“A criança pode sentir que não é suficiente, ao tentar corresponder a padrões impostos. Isso pode comprometer a construção da personalidade e gerar inseguranças que se estendem à vida adulta, com relações instáveis e dificuldade em se conectar com outras pessoas”, explica, Luana.
Nos casos mostrados por Felca, a combinação de imagens sugestivas, pouca vestimenta e músicas sexualizadas agrava a situação. Segundo a especialista, isso não apenas rompe o processo natural de desenvolvimento como também favorece a objetificação infantil.
“Cada fase da infância deve ser vivida e respeitada. A quebra desse ciclo natural traz prejuízos psicológicos profundos e, muitas vezes, irreversíveis”, afirma, Dal Moro.
As conselheiras concordam que é papel dos pais fiscalizar o conteúdo consumido e produzido pelos filhos. O Conselho Tutelar orienta que se evite a exposição de crianças em vídeos ou fotos que possam ser interpretados de forma sexualizada e que, em caso de dúvidas ou denúncias, os órgãos competentes sejam acionados.