Entre a ignorância e o saber

Ricardo Viveiros, jornalista, escritor e professor. É autor, entre
outros livros, de “A vila que descobriu o Brasil”; “Justiça seja
feita”; e “O poeta e o passarinho”.

Uma das razões que nos mantêm vivos é o desconhecido. Mistérios como
a vida e a morte, tudo o que não sabemos é um permanente desafio.

Buscar a verdade começa na descoberta do que seja a verdade. Tarefa
inatingível, porque não há verdade única. São muitas as verdades
definidas por seus respectivos criadores.

A ignorância é uma dádiva? O saber causa sofrimento?

Certos governantes preferem não investir em cultura e educação,
censuram a imprensa, porque o conhecimento faz o povo perceber que eles
não servem. E perdem o poder.

Liev Nikoláievich Tolstói, ou simplesmente Leon Tolstói, escritor
russo considerado um dos maiores literatos de todos os tempos, foi um
dos primeiros pacifistas e defensores da educação como a principal
porta para o conhecimento que liberta, que garante independência.

Tolstói foi o guru do ainda jovem Mahatma Gandhi, tendo influenciado o
grande líder indiano a defender o princípio da não-violência. Eles
trocaram intensa correspondência, em muitas cartas o indiano pedia
conselhos ao russo. Dessa relação nasceu um belo livro de Tolstói,
“Carta ao Hindu”. Na obra está o princípio
ético-filosófico-religioso de que ferir o próximo é ferir a si
mesmo, porque todo ser vivo tem energia espiritual divina.

Embora perseguido violentamente pela cruel polícia czarista da época,
há cerca de 150 anos Tolstói fundou mais de uma dezena de escolas
rurais no interior da Rússia. Ele é o precursor da liberdade na
educação de crianças e jovens, como também o pioneiro na gestão
democrática das instituições de ensino.

“A ignorância em si não é nem vergonhosa e nem maléfica. Ninguém
pode saber tudo. Mas fingir saber o que na verdade não se sabe é tão
vergonhoso quanto maléfico”, afirmou Leon Tolstói.

Desde o início da pandemia, o Brasil tem sido vítima de um dos maiores
índices mundiais de contaminação e morte. A pandemia causada pela
Covid-19 foi relativizada em nosso País com definições do presidente
da República: “fantasia”, “gripezinha”, “não é uma situação
alarmante”, “e daí?”. E foi, também por ele, dado o mau exemplo contra
o confinamento, uso de máscara, aglomerações e tudo o que deveria
merecer rígido protocolo de segurança sanitária. Somam-se a isso
“soluções preventivas”, como supostos remédios comprovados pela
ciência como ineficazes para a Covid-19, politização da vacina e, por
fim, a falta de um planejamento para a área a saúde. Foram três
ministros em apenas dois anos de governo, sendo o atual alguém de fora
da área.

Estamos, neste momento, em um novo pico de contaminações e mortes. A
situação no Estado do Amazonas é trágica — e não se pode atribuir
o fato, como de hábito, a “sensacionalismo da imprensa”. Como as
florestas devastadas por queimadas criminosas, a população do Amazonas
também está sem ar. Faltam oxigênio, aparelhos respiratórios, leitos
nos hospitais, profissionais de saúde, visão de estadista aos
governantes. Diante da gravidade do momento, o Amazonas recebeu oferta
de socorro da Venezuela.

Entre a realidade que dói e a ignorância que não dói, fico com a
coragem e a esperança que transformam.

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