O papel essencial da nutrição no combate a transtornos alimentares

A nutricionista, Eduarda Refosco, aponta a abordagem, sintomas e tratamentos da anorexia e bulimia. “Com orientação adequada, profissionais capacitados e o apoio, é possível obter sucesso”

Os Transtornos Alimentares (TAs), como anorexia e bulimia, representam um desafio complexo que afeta não apenas a saúde física, mas também a saúde mental de milhões de pessoas em todo o mundo. Embora possam afligir indivíduos de todas as idades, são os jovens entre 13 e 20 anos que se encontram em um ponto crítico de vulnerabilidade a essas condições preocupantes.

Para aprofundar o entendimento sobre essa questão, em entrevista ao Jornal Correio do Povo do Paraná, a nutricionista, Eduarda Refosco, fala dos desafios enfrentados pelos jovens e suas famílias quando se trata de TAs, bem como estratégias para a prevenção e o tratamento dessas doenças complexas.

Abordagem

Por tratar-se de TA, como a anorexia e a bulimia, a abordagem terapêutica desempenha um papel fundamental na recuperação e no bem-estar do paciente. Conforme Eduarda, o nutricionista, um dos profissionais capacitados para lidar com essas condições complexas, assume um papel crucial nesse processo.  “A abordagem apropriada deve ser não apenas específica, mas também sensível às necessidades individuais de cada paciente”, destaca.

Nessa jornada de tratamento, o protocolo ideal envolve modificações no consumo diário de alimentos de forma não invasiva, com o objetivo primordial de reestabelecer um relacionamento saudável com a comida. “Paciência é uma virtude essencial, pois cada pessoa responde de maneira única a essas mudanças. A missão do atendimento nutricional é multifacetada, incluindo a recuperação e a manutenção de um peso adequado, o estabelecimento de uma rotina alimentar saudável, a minimização de comportamentos radicais de controle de peso e a melhoria da percepção distorcida da imagem corporal”, detalha a nutricionista.

Contudo, Eduarda enfatiza que a abordagem vai além da mera modificação da ingestão de alimentos. Em um segundo momento, o foco se desloca para a relação que o paciente estabelece com os alimentos e com o próprio corpo. “É necessário entender os motivos que levam isso a acontecer. O sucesso do tratamento depende de vários fatores e a psicoterapia é um fator muito importante. O médico psiquiatra também faz parte da equipe de profissionais em alguns casos, pois o uso de medicações pode ser favorável”, aponta.

“A pesagem de alimentos ou a contagem de calorias podem gerar gatilhos emocionais e prejudicar a adesão do paciente ao tratamento. Em vez disso, utiliza-se o diário alimentar como uma ferramenta de autorreflexão. Por meio desse método de auto monitoramento, o paciente registra seu consumo alimentar, identifica a ocorrência de compulsões, relata a duração e o local das refeições e explora os sentimentos envolvidos nesse processo”, detalha Eduarda.

Sintomas

Segundo ela, os dois distúrbios são multifatoriais e podem acontecer devido a causas genéticas, traumáticas, psicológicas, sociais, hormonais, culturais e familiares.

Para compreender melhor essas patologias, é essencial examinar os sinais e sintomas que as caracterizam, abrindo caminho para a conscientização e a busca de ajuda precoce.

Em relação aos sintomas comuns entre a anorexia e a bulimia, ambos podem apresentar desidratação, fadiga, ansiedade, culpa, ausência de menstruação, constipação e sensibilidade ao frio como características compartilhadas.

No entanto, a anorexia é notoriamente associada a sintomas únicos, como baixa temperatura corporal, desmaio, pressão baixa, tontura, apreensão ou culpa, perda de peso extrema, vômito, cabelo ressecado, dor de cabeça, lesões na pele, pele seca, unhas quebradiças e queda de cabelo excessiva, além do comportamento de fazer dietas restritivas radicais.

Por outro lado, a bulimia apresenta seus próprios sintomas, incluindo compulsão alimentar, impulsividade, vômito, falta de moderação na ingestão e aversão a alimentos, mudanças de humor ou raiva, alterações no peso corporal ou perda de peso, menstruação irregular, má digestão, redução do paladar, cáries dentárias, depressão, dor de garganta, inanição e úlcera gástrica.

“Esses sintomas são indicativos de uma relação tortuosa com a comida, onde o controle excessivo do peso e da ingestão calórica se tornam uma obsessão. Tanto a anorexia quanto a bulimia são transtornos sérios que requerem intervenção profissional para reverter os danos físicos e psicológicos que elas causam”, destaca Eduarda.

Tratamento

As duas condições requerem cuidados diferentes. A bulimia é um distúrbio alimentar em que a pessoa come exageradamente alimentos variados, sem restrição de calorias, em um curto período de tempo. Há perda de controle sobre a alimentação, além de abuso de laxantes e episódios de vômito, para evitar o ganho de peso. “É necessário cuidar mais detalhadamente do sistema digestivo, pois o hábito de forçar o vômito ou tomar laxantes, pode desenvolver diversos problemas gástricos, como diarreia e dor de estômago. Além disso, há perda de líquido, fraqueza, tontura e erosão no esmalte do dente”, explica.

A pessoa anoréxica tem uma visão distorcida da própria imagem e sente dificuldade de aceitar o próprio corpo como ele é. O indivíduo tem a impressão de que está sempre acima do peso e por isso abusa de dietas restritivas, o que coloca ele em risco, sendo que a intervenção é corrigir as deficiências nutricionais. “As consequências da anorexia, por sua vez, são desnutrição, parada cardíaca, insuficiência renal, falência dos órgãos e risco elevado de morte. Daí a importância de entrar com medicações, até mesmo internação para reposição de nutrientes, dependendo da gravidade do caso”, detalha a nutricionista.

Contudo, Eduarda enfatiza que há a possibilidade de recuperação nos dois casos se o paciente estiver disposto a seguir o tratamento. “Após uma melhora no quadro de saúde e fora de risco, os acompanhamentos nutricionais podem ser menos frequentes, mas não devem ser interrompidos totalmente. Manter o tratamento é essencial para ajudar as pessoas acometidas a manter um peso saudável, pois pode haver recidiva”, aponta.

Entendimento

A nutricionista expõe que a compreensão dos transtornos alimentares é desafiadora, dada sua natureza multifatorial, o que dificulta a identificação de todas as possíveis causas. “Frequentemente, os pacientes omitem informações durante as consultas médicas, tornando o diagnóstico e tratamento, especialmente da bulimia, uma tarefa complicada. Além disso, a falta de adesão dos pacientes ao tratamento é uma dificuldade comum enfrentada pelos profissionais de saúde”.

Para ela, há esperança na pesquisa e tratamento dessas condições, já que abordagens multiprofissionais têm ganhado destaque, envolvendo diversas áreas para garantir o sucesso do tratamento. À medida que as redes sociais se tornam cada vez mais prevalentes, espera-se que os transtornos alimentares se tornem temas importantes de discussão, especialmente entre os jovens. “Os pais desempenham um papel crucial ao estar atentos aos sinais de distúrbios alimentares e manter um diálogo aberto com seus filhos, permitindo a busca de ajuda nos estágios iniciais. Isso marca uma evolução positiva na conversa sobre saúde mental”, enfatiza Eduarda.

“Tratar a anorexia e a bulimia é um desafio para a nutrição devido à necessidade de envolvimento do paciente, da família e da adaptação da rotina do paciente. Com uma orientação adequada, profissionais capacitados e o apoio, é possível obter sucesso no tratamento de transtornos alimentares, mesmo com suas múltiplas demandas”, finaliza a nutricionista.