Bolsonaro atrapalha vacinação no País
Ataques aos chineses e falta de habilidade diplomática podem comprometer as próximas etapas do Plano Nacional de Imunização e deixar as cidades sem vacinas
Uma série de trapalhadas do presidente Jair Bolsonaro – de alguns auxiliares: ministros Eduardo Pazuello (Saúde) e Ernesto Araújo (Relações Exteriores) e do círculo próximo – pode comprometer as próximas etapas da vacinação contra o coronavírus no País.
A situação já preocupa governadores, prefeitos e autoridades sanitárias, aflitos com a possibilidade de faltar vacinas devido às refregas e ao negacionismo do presidente. “Já nessa etapa não recebemos as doses previstas, aquém de imunizar os profissionais de saúde e os idosos abrigados em asilos”, disse um prefeito paranaense.
Os ataques persistentes à China que começaram antes mesmo da pandemia e o atraso no recebimento de dois milhões de doses da vacina Oxford levam os gestores à incredulidade ou tipo São Tomé, só vão acreditar se receberem os imunizantes conforme programados nos planos nacional, estadual e municipais de imunização.
Numa linha do tempo, Bolsonaro primeiro atacou a vacina chinesa Coronavac, os mais próximos a chamavam de vacina shing ling, o filho-deputado Eduardo Bolsonaro (PSL) chamou coronavírus de vírus chinês e o ex-ministro Abraham Weintraub destilou ironia e preconceito ao povo chinês. Os ataques ganharam repercussão nas redes sociais e provocaram dissabores na relação entre os dois países.
Falhou
A aposta de Bolsonaro na produção local da AstraZeneca travou a vacinação e com os números de caos e mortes (8.573.864. casos e 211.491 óbitos), não restou outra alternativa ao presidente do que adotar a vacina chinesa, com atraso considerável, mas a única (seis milhões de doses) distribuída aos 5.570 municípios brasileiros. Os dois milhões de doses do imunizante da Oxford ainda estão travados na Índia que colocou o Brasil na fila comum para receber as vacinas, o que deve demorar mais um mês ainda.
“A vacina é do Brasil, não é de nenhum governador”, disse Bolsonaro ao perder a narrativa da primazia da vacinação para João Dória (PSDB-SP). Como se vê, a vacina chinesa agora é brasileira, mesmo assim, os chineses não se esqueceram dos ataques bolsonaristas, o que leva governadores e prefeitos a perder o sono.
O que Bolsonaro esqueceu é que os insumos de qualquer imunizante produzido no mundo são da China. A Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) adiou de fevereiro para março a entrega das primeiras doses da vacina AstraZeneca que serão produzidas no Brasil devido ao atraso na chegada do insumo farmacêutico ativo (IFA) da China. A medida impõe a redução da quantidade de doses para os grupos prioritários e diminui o ritmo da campanha de vacinação iniciada nesta semana no país.
O Instituto Butantan parou também a produção de novas doses da coronavac por causa da falta de insumos chineses. No fim deste mês está prevista a chegada de 5.400 litros e mais 5.600 litros até o dia 10 de fevereiro. Quantidade suficiente para produzir até 11 milhões de novas doses, o que levará pelo menos dois meses. Até o momento foram distribuídas 6 milhões de doses da vacina e outras 4,8 milhões já estão prontas e aguardam autorização da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
E agora, José?
Outro problema em outro imunizante tripudiado no governo federal. O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal, determinou que num prazo de 72 horas a Anvisa envie informações sobre um pedido de uso emergencial da Sputnik, vacina desenvolvida na Rússia. A Sputnik já está sendo utilizada em países como Argentina, Bolívia, Paraguai e Venezuela. O Estado da Bahia quer importá-la.
O deputado Luiz Cláudio Romanelli (PSB) disse “muito ajuda quem não atrapalha” em relação ao presidente. Romanelli ainda classificou Bolsonaro de “inepto e tresloucado”. “Estamos atravessando uma das maiores crises econômicas, sociais e sanitárias da história e para azar (ou desespero) dos brasileiros, temos na cadeira do Palácio do Planalto o mais despreparado e desqualificado presidente da história do país. Isso para dizer, republicanamente, o mínimo”.
“Se as doses das próximas doses não chegar, o que vamos dizer. Com certeza, vão nos culpar e, o principal, como vai ficar a saúde das pessoas e das cidades, sem qualquer perspectiva de retomada da economia e dos empregos. O ano de 2021 pode ser pior que 2020, temos que nos mobilizar”, disse outro prefeito.
Produção das vacinas contra o coronavírus, mesmo no Brasil, depende de insumo farmacêutico produzido na China. Governadores e prefeitos sinalizam importar os imunizantes