Governo e bancos decifram o labirinto das fraudes online

Especialista analisa como Glossário criado pelo governo e bancos pode facilitar combate

O avanço dos golpes digitais no Brasil levou órgãos públicos e o setor financeiro a unirem esforços para enfrentar um problema que afeta milhões de pessoas todos os anos. Como parte dessa estratégia, foi lançado o Glossário de Tipologias de Fraudes e Golpes Digitais, documento que reúne, define e padroniza as principais modalidades de crimes praticados no ambiente digital e financeiro.
O material integra a Iniciativa 1.8 do Plano de Ação Conjunta da Aliança Nacional de Combate a Fraudes Bancárias Digitais. A aliança resulta de um acordo de cooperação técnica firmado entre o Ministério da Justiça e Segurança Pública e a Federação Brasileira dos Bancos. O objetivo central é criar uma base comum de conceitos que facilite a comunicação entre instituições financeiras, órgãos de segurança, empresas de tecnologia e consumidores.
Ao todo, o glossário apresenta dezenas de tipologias, organizadas de forma clara, com nomes, variações e definições objetivas. A padronização busca evitar ambiguidades na identificação dos crimes, além de apoiar a produção de estatísticas mais confiáveis, a troca de informações entre instituições e a adoção de medidas coordenadas de prevenção e repressão.

Padronização

As fraudes digitais cresceram acompanhando a ampliação do uso de serviços bancários eletrônicos, aplicativos de pagamento, comércio online e redes sociais. Com isso, surgiram práticas cada vez mais sofisticadas, que exploram falhas técnicas e, principalmente, o comportamento humano. O glossário surge como resposta a esse cenário, ao organizar o conhecimento sobre golpes já conhecidos e outros mais recentes.
Para o engenheiro de software Saimon Tolazzi, especialista em qualidade e segurança de softwares corporativos, a iniciativa cumpre um papel estratégico ao funcionar como uma linguagem comum de defesa. “A criação de um glossário ajuda, sem dúvida, como um idioma universal. Ao eliminar a confusão de termos técnicos, ele permite que bancos, empresas de tecnologia e a polícia identifiquem e reajam às ameaças de forma coordenada e muito mais rápida”, afirma.
Segundo ele, a padronização também favorece o compartilhamento de informações e amplia a compreensão da população sobre os riscos. “Essa unificação cria um padrão para ação rápida. Quando um alerta de ‘Golpe do Falso Leilão’ é emitido, todos os setores sabem exatamente quais são os vetores de ataque, o modus operandi e as medidas de mitigação imediatas, sem perder tempo ‘traduzindo’ o problema”, explica.
Outro ponto central do documento é a definição precisa de cada modalidade. Golpes semelhantes, mas com abordagens distintas, passam a ser classificados de forma uniforme. Isso reduz divergências de entendimento entre bancos, forças policiais, promotores, magistrados e equipes de atendimento ao consumidor, além de facilitar campanhas educativas.
O glossário também apoia a construção de bases de dados compartilhadas. Com conceitos alinhados, registros de ocorrências, reclamações e investigações podem ser comparados e analisados com maior precisão, permitindo a identificação de tendências e a adoção de ações preventivas.
A Aliança Nacional de Combate a Fraudes Bancárias Digitais destaca que o documento não tem apenas caráter técnico. Ele também cumpre função educativa, ao servir como referência para consumidores, jornalistas, empresas e profissionais que lidam com o tema no dia a dia. Ao compreender melhor como os golpes funcionam, a sociedade amplia sua capacidade de prevenção.

Informação e prevenção

Além da padronização, especialistas alertam que o fator humano segue sendo um dos principais alvos dos criminosos. Tolazzi ressalta que, mesmo com ferramentas de segurança avançadas, a falta de conhecimento ainda representa uma brecha significativa. “Não importa o quão bom seja um antivírus ou um firewall. Se a pessoa não entender como esses ataques funcionam, especialmente os de engenharia social, o risco continua elevado”, afirma.
De acordo com o especialista, grande parte das fraudes atuais ocorre por meio de phishing e manipulação psicológica, e não apenas por falhas técnicas. “Muitos ataques começam com um e-mail falso, um link malicioso ou um site clonado, usados para capturar dados e obter acesso aos sistemas de empresas e usuários. As pessoas muitas vezes não têm noção do quanto um atacante consegue acessar ao explorar esse tipo de abordagem”, explica.
Nesse contexto, o treinamento contínuo de colaboradores e a conscientização da população aparecem como medidas essenciais. “Quando as pessoas aprendem a validar se um e-mail é verdadeiro, a desconfiar de promessas de prêmios ou solicitações inesperadas de dados, os ataques passam a ser evitados em uma escala significativa”, destaca Tolazzi.
Ao longo desta série de reportagens, cada grupo de golpes será detalhado, com foco no funcionamento das fraudes, nos contextos mais comuns e nos cuidados que podem reduzir o risco de prejuízos. A proposta é transformar informação técnica em conteúdo acessível, sem perder o rigor jornalístico.